quinta-feira, 9 de maio de 2013
Paul McCartney e sua aura
Num famoso ensaio dos anos 1930, o filósofo Walter Benjamin, brilhante pensador alemão vitimado pelo nazismo, critica a chamada indústria cultural – termo cunhado pela influente Escola de Frankfurt, formada por marxistas como Theodor Adorno e Max Horkheimer – pela produção em escala de cópias. O texto, que tem o pomposo nome de A Obra de Arte na Era de Sua Reprodutibilidade Técnica, discorre sobre como as tecnologias, já na primeira metade do século passado, possibilitavam que criações artísticas se disseminassem à exaustão, banalização que afetava o que o autor designa como a aura da obra original.
Benjamin centrava seu debate para a relação da fotografia e as artes plásticas, mas seus raciocínios poderiam ser discutidos em outros campos, como a música. Sem avaliar se esses autores eram ou não pessimistas e elitistas – críticas constantes ao grupo –, quero aqui concordar que grandes artistas e seus trabalhos originais têm, sim, aura. Ao assistir ao show de Paul McCartney em Goiânia, foi essa a sensação que tive. Ao vê-lo interpretando os sucessos dos Beatles, pensei: “Caramba, é o original! Não é alguém cantando as músicas dos Beatles. É um beatle!”
Essa imagem mitológica é algo muito forte, não só para teóricos e críticos de arte. Ela chega aos mais profundos sentimentos do público e explicam histerias e devoções incondicionais. Na segunda, estive no Serra Dourada para registrar, como repórter, a chegada do astro. No local, alguns fãs o aguardavam ansiosos. Quando finalmente ele passou, a apenas 3 metros de distância de nós, acenando da janela aberta do carro, muitos ali não gritaram. Sequer conseguiram fazer isso. Pareciam não acreditar estar tão próximos de Sir Paul.
Essa paralisia faz parte da aura da obra de arte. Muitos sentem isso ao encarar a Monalisa no Museu do Louvre, em Paris. Não que o quadro seja uma novidade em si. O famoso sorriso é mais do que conhecido. Mas a tela exerce este misterioso sentimento. Afinal, é ela que contém as pinceladas originais de Leonardo Da Vinci. Não é uma imitação. É o quadro. Paul não é alguém que foi influenciado por uma banda de Liverpool. Ele é parte dessa banda. É estranho pensar que esse cara, autor de tantos clássicos, está ali, a três metros de você. Depois está no palco, cantando de viva voz os grandes, os maiores sucessos não só do grupo, mas do pop e do rock mundial.
Paul McCartney é único, insubstituível. Ele tem esse algo mágico, intangível e ainda assim palpável, essa aura de que fala Benjamin. Vê-lo ao vivo é uma experiência inexprimível para os fãs, impossível de explicar. É como se a Monalisa estivesse num museu de Goiânia para ser apreciada. Essa talvez seja a razão que resume, em grande parte, todas as outras que fazem com que o show de Sir Paul no Serra Dourada seja, sim, um marco nesta cidade. Quem foi ao estádio curtir sua música viu a história acontecer.
Artigo publicado no jornal O Popular do dia 8 de maio de 2013
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