quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Dona Iraci Vai Cair de Novo

Adoro Dona Iraci, essa mulher que criei a partir de tantas que andam por aí... Caindo.


– Minha filha, você não devia ter dito aquilo pra Dona Iraci. Já falei pra você não bater boca com vizinho.
– Mas, mãe, dessa vez essa fofoqueira da Dona Iraci passou dos limites! A senhora viu o que ela falou de mim lá no chá de panela da Laura?
– Ela não falou por mal, Lourdinha.
– Ela não falou por mal!? Não falou por mal!? Mãe, ela me chamou de encalhada, disse que do "jeito" que eu ando na rua, nunca que eu vou arrumar homem pra casar!
– É que ela é muito franca, filha. É o jeito dela.
– Franca o escambau. Aquela mulher é uma cobra. Disse que a minha saia é muito curta, que eu ando muito maquiada. Velha invejosa, isso sim!
– Não fala assim, Lourdinha. A Dona Iraci é uma pessoa de certa idade e sofreu aquele acidente horrível no ônibus, coitada. Deve ter batido a cabeça.
– Pois deveria ter quebrado a cabeça mesmo e não apenas a cabeça do fêmur! Bem feito pra ela!
– Lourdinha, pára com isso. A gente não deve desejar mal a nenhuma pessoa. Tem muita gente que gosta da Dona Iraci.
– Dona Iraci não é "pessoa" coisa nenhuma. É uma bruxa! Feia como o cão! Com aquelas pernas cheias de varizes, com aquele monte de sacolas que ela anda por aí.
– Coitada, ela fez uma cirurgia nas veias, não lembra? Andou de meia kendall um tempão. Mas aí as varizes voltaram...
– Também, a diaba não guardou repouso. Ficava por aí zanzando atrás de alguma fofoca. Não sossega o facho.
– Mas minha filha...
– Pára de defender a Dona Iraci, mãe. Pois fique sabendo que um dia ela me chamou de sádica, disse que duvidava que eu tivesse nascido de uma mãe...
– Aquela lambisgóia disse isso?
– Disse sim senhora.
– Mas, mas...
– Vai, defende a velha fuxiqueira, defende...
– Mas eu vou mostrar pra aquela bucha de canhão quem é que não tem mãe! Aquela filha de chocadeira vai se ver comigo...
– Aonde a senhora vai, mãe? Espera... Mãe... Volta aqui...
– Me deixa Lourdinha, vou lá acertar as contas com a Dona Iraci.
– Mas a mulher tá entrevada na cama, com pino na perna.
– Não interessa. Ela vai ver com quem mexeu. E te digo uma coisa, Lourdinha. Do jeito que eu tô nervosa, conforme for, hoje a Dona Iraci vai cair de novo.

sábado, 8 de novembro de 2008

É uma cadela



Vamos celebrar nossa vaidade



Lili, tão bonitinha. Parece uma princesinha. Branquinha, cheirosinha, arrumadinha. Vestido branco para o seu aniversário de um aninho. Meu bebê. Gud, gud!!!! Parece até que já entende que tudo isso é pra ela. Menina esperta! Todos os seus amiguinhos foram convidados. Todos aqueles que brincam com ela no parque, no play do condomínio fechado em que mora. Lacinho rosa na cabeça, perfume francês especial para a ocasião. Um bolo exclusivo foi encomendado na confeitaria que sempre organiza as festas da família. Tenho certeza de que ela vai adorar essa receita de bolo de filé (?!) E os brigadeirinhos de ração importada, então (????!!!!!!)


É, Lili é uma cadelinha de uma raça impronunciável, mais feia que a morte. Mas a dona a acha linda e não percebe que se o bicho gostasse da fruta, seria o próprio capeta chupando manga. Mas é a Lili, a xodozinha da madame, aquela que tem todas as mordomias, a paparicada, que tem até uma babá. Por tratar a cadela como gente, a patroa trata a babá como cachorro. Mas quem pode, pode, não é mesmo? Vamos celebrar nossa vaidade em suas mais absurdas demonstrações de afetação.


Mas há horas em que essa gente tão ocupada em divertimentos caninos se cansam, sabe? Cansam, cansam... Dizem assim: cansei! Dondoquices e afetações cansam, acha que não? Ir a cabeleireiro fazer penteados vistosos, empastar o rosto de maquiagem, cuidar do modelo do vestido, ir a Nova York, esquiar em Aspen, escolher o carro novo, preparar aniversário de cachorro. UFA!!!! Claro, tem ainda a bala perdida, tem o desemprego, a violência, a fome. Claro, eles também se preocupam com isso. Fazem até chás beneficentes para cuidar do assunto com as amigas. Aproveitam para falar mal das ausentes, fofocar sobre possíveis traições na alta roda, mas comparecem com as contribuições que mostram toda a generosidade que têm.


Uma generosidade para os despossuídos que dá, mais ou menos, uns 20% do que a dona da Lili gastou com a cadelinha de luxo. Mas a Lili é como um membro da família. Merece a festinha, ora. Ou você acha que é fácil cuidar de um cachorro de raça, que precisa estar cercado de todos os cuidados. É como uma criança. Branquinha, peludinha, cheirosinha, com vestidinho e laço rosa. Coisa mais linda, Lili!