Foram 65 vezes.
No último um ano e meio, fui e voltei de Brasília 65 vezes para assistir aulas na UnB.
No primeiro semestre, ia e voltava duas vezes por semana: ia na terça à noite, voltava na quarta depois do almoço; ia na quinta à noite, voltava na sexta, depois do almoço.
No segundo semestre, ia no domingo à noite, voltava na terça depois do almoço.
No terceiro semestre, ia no domingo à noite, voltava na segunda, depois das 10 da noite.
Indo e vindo, indo e vindo.
Ontem, 29 de junho, assisti minhas últimas aulas do doutorado.
Acabou o vai-e-vem semanal. Nem acredito.
No início do ano passado, muitos, muitos, bem ou mal intencionados, preocupados ou não comigo, amigos, colegas de trabalho, meros conhecidos fizeram um coro numeroso: "você não vai dar conta."
Quando eu chegava à redação, muitos diziam: "como você está cansado, não vai aguentar."
Mas fui levando, fazendo ouvidos moucos. Não que me sentisse inatingível, mas aqueles comentários passaram a ser não um problemas, mas um estímulo a mais.
Conseguiria sim, nem que fosse para calar a boca de todos.
Quando muitos perceberam que sim, eu estava sobrevivendo, deixaram de agourar, talvez por medo de queimar a língua. Talvez.
Mas eles, no fim das contas, são os que menos importam neste momento.
Importam, na verdade, aqueles que nunca deixaram de me apoiar.
Vai aqui um agradecimento especial a duas amigas especiais: Karla e Veruska. Elas abriram seus apartamentos, abriram mão da privacidade de pessoas que moram sozinhas, para me receber toda semana, sempre com um lanche, um bom papo, palavras de encorajamento. Às duas, nunca terei como agradecer.
E nunca terei, também, como agradecer às rezas de meus pais todos os dias em que eu pegava a estrada: proteção contra acidentes, contra motores pifados, contra radiadores furados, contra pneus estourados, contra todo e qualquer empecilho no caminho.
As rezas funcionaram perfeitamente. Nada, em nenhuma vez, ocorreu. Na única vez em que o carro pifou, ele pifou depois que cheguei em Goiânia, na frente da casa de outra amiga querida, Amanda, no dia uma caroneira. E caronas foram mais que caronas nesta jornada: foram companhias preciosas em mais de duas horas de solitária viagem, sempre com as mesmas paisagens, os mesmos marcos, os mesmos buracos da estrada.
Sustos foram muitos. Em Abadiânia, à noite, precisei, num dia, desviar de uma mulher que atravessou a rodovia em sua bicicleta; num outro, de um cavalo que cruzou a BR na maior tranquilidade do mundo. Em uma vez, atropelei um cone de uma obra mal sinalizada perto de Alexânia. Outra vez, levei uma fechada fenomenal no trevo do Daia, em Anápolis, de uma carreta de incontáveis toneladas.
Confesso aqui que cochilei ao volante em uma de minhas vindas, já chegando a Goiânia, numa pescada que me valeu o maior dos sustos e uma guinada violenta no volante. Mas somos preparados para os sustos quando eles são apenas isso: sustos.
Nessas minhas idas e vindas, vi um motoqueiro morto, atropelado em Teresópolis, e um outro, dentro de Brasília, com o corpo já coberto por jornais. Vi carretas com as rodas para cima, carros capotados depois de surpreendidos por aquaplanagem.
Foram 65 idas e 65 vindas. Foram, ao todo, 28.600 Km percorridos. Seria como percorrer seis vezes a distância entre Porto Alegre e Manaus, ou percorrer três vezes a distância entre São Paulo e Johanesburgo, na África do Sul, ou duas vezes a distância entre a capital paulista e Nova Dheli, na Índia. Nunca pensei que dirigia isso tudo na vida.
Mas dirigi. Estou fazendo este post não para me gabar, mas para desabafar, para comemorar com os que nunca duvidaram desta empreitada, e para jogar na cara de quem duvidava que não devemos duvidar das pessoas, ainda mais das que não conhecemos bem.
Muitos que me apoiaram leem este blog e a eles eu agradeço.
Alguns que duvidaram também leem este blog e a eles eu também agradeço, mas de forma bem diferente, bem menos fraterna. Com os primeiros quero compartilhar aqui minha alegria. Com os outros, não quero compartilhar nada, apenas informá-los de que estavam errados.