terça-feira, 30 de dezembro de 2008

2008/2009

2008 foi um ano com:

21 mil quilômetros rodados entre Goiânia e Brasília

260 horas de aulas nas carteiras da UnB

60 encontros de orientação de três formandas da Católica

Um apartamento novo

Quase 3 mil reais de gasto com um carro velho

50 pessoas queridas dentro do apartamento novo

Quase 40 especiais de domingo

15 dias de férias

Banhos de mar em São Luís

Passeios nas ruas de Paraty

Quase 80 noites dormidas em casas de amigas em Brasília

Roteiro cultural em São Paulo

Incontáveis partidas de sinuca ganhas e perdidas

Quase 50 livros de teoria lidos

Maior intimidade com Foucault, Weber, Heidegger e Peirce

Uma crônica por mês

Um bocado de carência afetiva

Uma mudança de casa

Uma mudança de planos profissionais

Um grande afago no ego profissional

Algumas noites de depressão

Algumas saudades não satisfeitas

Alegrias e preocupações com os sobrinhos

Nenhuma grande matéria

Alguns sonhos para 2009

Em 2008, sonhar foi possível e necessário.
Em 2009 temos que continuar sonhando. Mesmo que os sonhos não se realizem
Feliz sonhos novos

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

"Essa rua tá estreita"



"Essa rua tá estreita..."
E vai o pau d´água, o pudim de cachaça, o pé de cana barbeirando no meio da via pública. É Deus que não deixa ele dar com as fuças na calçada. Vai desviando de lixeiras, vai espantando cachorros que latem assustados, vai escorando nos postes, pegando fôlego para continuar. Vai apalpando os bolsos já sebentos das calças já largas que cobrem um corpo já combalido pelo vício, procurando algo que já não possui.

É sempre um homem de muitas casas. Cada boteco, uma morada. Cada dose conquistada de um cliente incauto ou louco para se ver livre da encheção de saco dos pedidos feitos em língua dormente, uma vitória. É sempre um homem que acumula muitas vitórias diárias.
Também é um homem que tem freqüentes visões do paraíso. Entra nos bares e passa o olho mole e remelento, vermelho de tanto álcool, por prateleiras em que rebrilham o que mais deseja: a cachaça.

O bêbado de rua não reclama da cama, que pode ser qualquer coisa. Um pedaço de papelão, uma mesa de sinuca que dorme no alpendre de um bar, um cantinho da sarjeta. É uma pessoa que valoriza cada centavo, porque cada centavo equivale um tantinho mais de pinga no copo. É um homem que tem muitos amigos, afinal, chega com aquela intimidade grudenta em qualquer desconhecido que lhe atravesse o caminho.

É também um homem religioso, sempre guarda um pouquinho pro santo. Não para os filhos que precisam ser sustentados pela mãe ou por uma das avós, que quase morrem de trabalhar para comprar leite e pão para a molecada. Mas para o santo, para esse não falta. E o bêbado se sente o homem mais digno do mundo ao jogar um bocadinho da pinga no chão, comove-se com sua própria grandeza.

O bêbado é um homem de opinião e a dá sempre quando ninguém a pediu. Costuma pegar o bonde andando e, geralmente, cai. Mas cair, de alguma forma, faz parte de sua rotina. Joelhos e cotovelos já estão para lá de acostumados com a falta de equilíbrio do resto do corpo. O pinguço gosta de palpitar sobre política, sobre economia, sobre futebol e, se deixam, até sobre a mulher do próximo. "É uma vagabunda!"

Ah, sim, o bêbado também apanha. Do marido da "vagabunda" ou de qualquer outro que perde a paciência com seu estilo entrão, com seus trejeitos de atrevimento, do jogador de bilhar que não agüenta mais os comentários inconvenientes em torno da mesa, do freguês já saturado de tanto ouvir do cachaceiro que ele gosta de beber sim e que ninguém tem nada a ver com isso; que sua saúde é de ferro, omitindo que já bota os bofes pela boca pelo menos uma vez ao dia e que já não agüenta de dores nas juntas.

O bom de copo toma no frio para esquentar, no calor para refrescar, no domingo porque é dia de folga, na segunda para dar coragem, na quarta porque trabalhou muito, na sexta porque é sexta. Não faltam justificativas para encher a cara, fazer caretas quando a pinga desce rasgando, para se gabar, já embriagado, de que não fica bêbado nunca, que é mais forte que um touro; que quando quiser parar, pára; que é dono de seu destino.
O pau d'água, o pudim de cachaça, o pé de cana é ou não é uma instituição? Uma instituição que mal cabe em si. E mal cabe na rua também...
"Essa rua tá estreita..."

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Odeio Adesivos, Graças a Deus



Vocês já perceberam o quanto as pessoas têm necessidade de gritar em público, chamar a atenção de desconhecidos, se fazer notar na multidão? Alguns poucos têm a coragem necessária para dar uns berros no meio da rua, rir alto, contar piadas a quem nunca viu mais gordo. Outros – a maioria – encontra outra forma: pregam adesivos nos carros. E devo confessar que a mim seria mais agradável ter os tímpanos estourados por um descompensado do que, a toda esquina, ter que me deparar com os arremedos de frases de caminhão que circulam por aí.

A lista é longa e é preciso reconhecer que em alguns casos há alguma originalidade nos recados que ninguém pediu para receber. Uma vez, em uma Brasília caindo aos pedaços, li a seguinte frase: "prefiro carro velho que andar de ônibus". Eu concordo. Andar de ônibus em Goiânia é um castigo do purgatório. Dos males, o menor.

Mas a maioria dos adesivos não tem tanto humor. São apenas metidos a engraçadinhos. "Rastreado por fofoqueiros". Ha... ha... há... Que engraçado, não é mesmo? Que espirituoso!!!!! Chega a ser genial!!!!!!! A pessoa que coloca uma bobagem dessas no carro se acha. Ah, se acha! Acha que todo mundo se importa com sua vida, que todos não têm nada mais para fazer que ficar espionando-o.

O adesivo de carro que mais me irrita é o que faz menção à religião do ocupante. Muitos evangélicos gostam de pregar o seguinte aviso: "Deus é Fiel". E quem disse que Ele não é? E quem perguntou? Quando a discussão sobre a fidelidade de Deus foi colocada em pauta?
Tem outros que são mais apocalípticos: Jesus voltará!!! Gostaria muito de saber como estas pessoas têm tanta certeza disso. Alguém ligou avisando que Jesus está a caminho? Como é que eles sabem? Será que têm alguma linha direta com o Céu pela qual recebem informações privilegiadas?

Um dos piores adesivos, em minha opinião, é o que anuncia: "sou católico graças a Deus"! Mesmo? Que coisa, não? E o que o pobre pedestre tem a ver com isso? Que utilidade essa informação tem para os outros? Isso dá alguma espécie de salvo-conduto ao motorista, que já teria alcançado a Salvação na Vida Eterna, Amém? E "ser católico graças a Deus" me parece um tanto redundante. Graças ao capeta é que não seria, concordam? E o engraçado é que esse pessoal coloca tais adesivos demonstrando a sua fé, mas muitos deles vivem por aí xingando o motorista da frente, dando fechadas no condutor que vem atrás, passando por faixas de pedestres sem parar. Mas o adesivo está lá, firme, dando ares de santidade ao carro.
No meu veículo tem uns adesivos também, confesso. Um de lavajato, outro de um shopping e um terceiro, todo embolorado, com a imagem da Virgem Maria.

"Ahan!!!! Então quer dizer que você também tem um adesivo religioso no carro e fica falando mal dos outros", devem estar pensando aqueles que se sentiram atingidos pela crônica.
Sim, tenho. Mas este adesivo está pregado há tanto tempo que não sai mais. Já tentei, juro por Deus! Juro pelo que há de mais sagrado neste mundo que já tentei me livrar do adesivo mariano. Esse adesivo me persegue tanto que estou pensando em colocar meu carrinho santificado à venda, com adesivo e tudo. Algum católico, graças a Deus, estaria interessado em adquiri-lo?